Os modelos oceânicos analisados pelos principais centros mundiais de monitoramento indicam possibilidade de El Niño influenciar negativamente o regime de chuvas no Nordeste brasileiro. O monitoramento via satélite do Índice de Vegetação do Semiárido, divulgado pelo Lapis, em parceria com o Insa, destaca que a maior parte da região continua enfrentando secas.
No final de 2016, o curto período em que as águas do oceano Pacífico estiveram mais frias que o normal e houve a formação de um fraco fenômeno La Niña, aumentou as expectativas dos cientistas sobre possível chegada das chuvas no Semiárido brasileiro em 2017. A região já enfrenta seu sexto ano de seca e a tendência de ocorrer El Niño possivelmente venha a agravar a atual situação da seca no Nordeste.
O motivo é que desde janeiro deste ano, as temperaturas das águas do Pacífico Equatorial encontram-se em elevação. Essa característica oceânica indica possibilidade de ocorrência de El Niño, fenômeno diretamente ligado às secas no Nordeste brasileiro. Na região leste, chamada de Niño 1+2, os desvios de temperatura passaram de 2°C na segunda quinzena de fevereiro.
Embora as projeções não sejam consensuais, as tendências indicam que no período de abril a junho, o El Niño possivelmente influenciará no clima do Nordeste brasileiro, ocasionando mais secas.
O primeiro instituto a sinalizar para o aumento da chance de ocorrência El Niño para 2017 foi o Bureau of Meteorology, da Austrália, em boletim de 28 de fevereiro. De acordo com o Órgão, seis das oito simulações indicaram potencial para El Niño até julho deste ano. O Instituto Americano de Oceanografia e Meteorologia (NOAA), dos Estados Unidos, em boletim de 09 de março, indicou maior chance de El Niño na primavera do Hemisférico Sul.
Destaca-se ainda o Instituto de Pesquisas Internacional (IRI), da Universidade de Colúmbia, que em sua previsão de consenso divulgada em 09 de março, indicou maior chance de El Niño a partir do trimestre julho-agosto-setembro. Em todos os casos, os institutos afirmaram que a habilidade das simulações diminui nas estações de transição. Ou seja, poderá haver correção de rumo nas próximas atualizações.
Aliado a isso, chama-se atenção que os desvios previstos por todas as simulações são baixos, pouco acima de 0,5°C, fazendo com que o aquecimento fique no limiar entre neutralidade e ocorrência de El Niño. Tudo isso poderá gerar um efeito semelhante ao registrado no ano passado, quando os institutos indicaram potencial para La Niña no primeiro semestre de 2016, voltaram atrás e indicaram neutralidade para o decorrer do ano e, finalmente, reafirmaram o fenômeno La Niña no segundo semestre de 2016.
Do ponto de vista meteorológico, eventuais retrocessos no anúncio do El Niño não afetarão o cenário previsto. As simulações indicaram um inverno mais úmido que o normal no Centro-Sul do Brasil, em função da elevação das temperaturas das águas do oceano Pacífico, independentemente do rótulo do fenômeno. Já o mercado deverá repercutir e oscilar mais, já que trabalha com expectativa e frustração.
O que está causando a seca no Semiárido?
O atual mapa de monitoramento da seca divulgado pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites (Lapis/Ufal), em parceria com o Instituto Nacional do Semiárido (Inca/MCTIC), mostra que a seca continua na maior parte do Semiárido brasileiro. Mas o que está causando a ocorrência desse fenômeno na região? Por que tem chovido em algumas áreas do Nordeste Setentrional (em parte dos estados do Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte), enquanto outras regiões do Nordeste continuam enfrentando severa seca?
Existe um sistema atmosférico chamado Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), que corresponde ao principal fenômeno meteorológico responsável pelo regime de chuvas no Nordeste. A ZCIT está estreitamente relacionada à Temperatura da Superfície do Mar (TSM). É um conjunto de nuvens carregadas que geralmente se formam sobre, ou próxima, às altas TSMs. Essa relação parece ser válida para a maioria dos anos.
A temperatura das águas do Atlântico exercem influência significativa na ocorrência de chuvas na região seca do Brasil. Pode ocorrer várias situações dessa gangorra térmica: Atlântico Norte mais quente do que o Atlântico Sul, Atlântico Sul mais quente do que o Atlântico Norte e também a situação de neutralidade, sem diferença relevante entre a temperatura do Atlântico Norte e do Atlântico Sul. Quando as porções equatoriais Norte e Sul do Atlântico estão com temperaturas diferentes, forma-se um dipolo.
As águas mais quentes no Atlântico Sul Tropical e mais frias no Atlântico Norte Tropical estão associadas com anos chuvosos no Nordeste. Durante os primeiros meses de 2017, notou-se que, na média, o Atlântico Norte ficou mais quente, enquanto grande parte do Atlântico Sul passou por um processo de esfriamento.
A associação das temperaturas do Atlântico Sul (quente) e do Atlântico Norte (frias) influenciou a posição da ZCIT, fazendo com que convergisse para áreas do Nordeste Setentrional, favorecendo a ocorrência de chuvas em parte dos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba.
Texto: Catarina Buriti (Ascom do Insa)
*Com informações de Humberto Barbosa (Coordenador do Lapis/Ufal)